Público
"Polícias À Portuguesa – Take 2" lançado esta quarta-feira
São dezassete os retratos e relatos na primeira pessoa de vidas em risco
ou riscadas pela morte reunidos em "Polícias À Portuguesa – Take 2",
livro publicado nesta quarta-feira, pela Babel. "Dar a palavra e a
visibilidade" aos actores policiais e aos seus dramas pessoais e
profissionais foi o motor do segundo volume de um projecto de
"jornalismo cívico" liderado por Fernando Contumélias e Mário
Contumélias.
Um agente da PSP mordido no braço por um ex-autarca que se dirigiu à
esquadra de Oeiras a gritar que não pagaria a coima e o reboque do carro
mal estacionado pela filha. A irmã de um inspector da PJ atingido e
morto por uma metralhadora kalashnikov que recebeu apoio
psicológico apenas quatro anos depois do incidente fatal. Um inspector
que afirma ter perdido as ilusões sobre a ética e a defesa da profissão,
quando entrou há doze anos na judiciária, e já pensou em suicidar-se em
momentos de maior aperto.
As "estórias" e as pessoas acima
apresentadas não são ficcionais, embora pudessem figurar em "filmes de
acção e emoção". Quem o afirma é Mário Contumélias, um dos autores do
livro "Polícias À Portuguesa – Take 2", a sequela de uma saga iniciada
há três anos. Se o "take 1" focava só os dramas da Polícia de Segurança
Pública, o segundo é mais abrangente e vai buscar testemunhos de agentes
das três forças de segurança – PSP, GNR e PJ – no activo, e de viúvas,
familiares e amigos dos polícias que não puderam contar as suas
histórias.
Confrontados com o número elevado de mortes de
polícias – entre suicídios e mortes em exercício de funções –, o
sociólogo Mário Contumélias e o empresário Fernando Contumélias, pai e
filho, decidiram dar continuidade ao projecto de "jornalismo cívico, de
proximidade" que iniciaram em 2008. Mário Contumélias, etno-sociólogo e
ex-presidente do Sindicato de Jornalistas, admite que este livro vem
colmatar uma lacuna aberta pelo jornalismo "que se institucionalizou e
governamentalizou, que privilegia a propaganda à informação".
Outras
razões motivaram esta nova investida nos meandros do meio policial: "A
realidade não se alterou para melhor (desde o primeiro volume), a
generalidade das hierarquias das polícias em Portugal continua a
interagir mal e faltava dar uma dimensão humana aos problemas dentro
delas", afirma ao PÚBLICO Mário Contumélias.
Em "Polícias À
Portuguesa - Take 2", os autores desenvolveram tópicos mal explorados na
imprensa generalista, recorrendo a fontes de instituições sindicais da
PSP, GNR e PJ. Os sindicatos indicaram as pessoas que melhor poderiam
falar de pressões, dramas e medos abafados no contexto laboral. Segundo
Mário Contumélias, os "nomes fictícios" utilizados pelos agentes nos
depoimentos são um exemplo dos limites de liberdade de expressão no seio
das polícias nacionais.
Fernando Negrão, ex-director geral da
PJ, que apresentou esta tarde o livro no Museu Nacional de Arqueologia,
em Lisboa, atribuiu a esta colecção de entrevistas a virtude de "abrir a
porta dos polícias [à sociedade civil], dando a oportunidade de se
conhecer o seu interior". O actual deputado do PSD alertou para a
situação de falta de protecção a que têm sido votadas as forças de
segurança nacionais pela classe política.
Para o
social-democrata, os problemas que o livro aborda devem estar na agenda
política, entre os quais a unificação das polícias, uma proposta do PSD
que foi travada nas negociações da coligação governamental pelo CDS,
aquando da elaboração do programa do governo recentemente empossado.
As
condições de trabalho da PSP e da GNR – o equipamento, as esquadras e a
formação de pessoal –, as deficiências na gestão e no acompanhamento de
recursos humanos, a ineficiência na coordenação entre as três forças
policiais, o mau acompanhamento psicológico e profissional de algumas
hierarquias foram outras fragilidades que Fernando Negrão relembrou.
"Não nos esqueçamos do homem e da mulher que estão dentro da farda que
vestem", disse.
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